Realizado pela Associação Nacional de Educação Católica, o encontro visou reforçar a necessidade de criar uma aliança entre as instituições para a promoção da educação antirracista
Em um país ainda marcado pelo abismo racial e de renda, entender e desenvolver uma educação antirracista é fundamental para que justiça e sociedade caminhem juntas. Na área educacional, 74% dos jovens brancos concluíram o ensino médio com até 19 anos, essa é a realidade para apenas 53,9% dos negros e 57,8% dos pardos, conforme revela levantamento divulgado ano passado pelo Todos Pela Educação.
Os dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb/Inep) de 2017 tornam ainda mais nítida essa disparidade. Na época, 59,5% dos estudantes brancos cursando o 5º ano tiveram uma aprendizagem em matemática tida como adequada e somente 29,9% dos negros se encaixaram no mesmo quadro.
Na última semana, a Associação Nacional de Educação Católica (ANEC) realizou uma live com o tema “Currículo Antirracista e Educação Católica” em seu canal do YouTube. O encontro teve como objetivo promover a conscientização sobre o racismo e discutir como a educação pode impactar positivamente a sociedade.
Roberta Guedes, gerente da Câmara de Educação Básica da ANEC, foi responsável por dirigir o bate-papo, que também contou com a participação da diretora 2ª tesoureira da ANEC, Irmã Carolina Mureb, da professora Rosemary Francisca Silva e da professora Janine Rodrigues.
A gerente da Câmara de Educação Básica da ANEC iniciou a live, levantando a seguinte questão: “Que currículo é esse que precisamos defender?”. Em seguida, a anfitriã passou a fala para a Irmã Carolina Mureb, que afirmou que — pensando na educação católica e nesse novo currículo — é necessário alinhar duas propostas muito próximas.
“Se olharmos para o Papa Francisco, ele vai falar sobre a necessidade de uma nova aliança em prol das gerações mais jovens, que vai resultar, então, na proposta do Pacto Educativo Global. Francisco entende que, para que essa educação seja, de fato, transformadora […] em vista daquilo que a nossa sociedade precisa, não bastam esforços isolados, é preciso uma aliança de diversas instituições e diversos atores para que essa educação possa acontecer”, comenta.
A outra proposta, segundo Camila, gira em torno de um relatório apresentado pela UNESCO, cujo título é “Reimaginar nosso futuro juntos”, de 2022. Um dos temas tratados pelo documento é a necessidade de um novo contrato social. “Então, são duas palavras, duas expressões diferentes, mas que, na verdade, expressam uma mesma compreensão da necessidade atual”, ressalta a Irmã.
Carolina ainda destaca que, seguindo esta linha de aprendizado, é necessário criar um novo arranjo que envolve diversos atores sociais na construção de uma proposta de educação que responda à realidade na qual estamos inseridos atualmente. “A ideia de interdependência, numa perspectiva, digamos assim, laica, está muito próxima da compreensão de fraternidade universal, incluindo o próprio planeta”.
Outro ponto importante levantado diz respeito ao modo como pensamos no próximo: não como um concorrente que deve ser superado, não como um inimigo a ser eliminado, mas como um irmão. “Sem essa interdependência, vai ficar muito difícil — para não dizer impossível — pensarmos na construção de futuros pacíficos, justos e sustentáveis”, reforça.
A importância de proporcionar sentimento de pertencimento e valorização no ambiente escolar
Na sequência, a professora Rosemary Francisca da Silva foi convidada para dar continuidade ao assunto. Ela explica que, dentro dessa conjuntura, surge a necessidade de abordar práticas relacionadas à política antirracista, reconhecendo o papel crucial da educação.
“Dentro dessa visão abrangente, a política antirracista vem despontando como um eixo fundamental para a política de oportunidades educacionais. Ao olharmos para a história do Brasil, é impossível ignorar as profundas cicatrizes deixadas ao longo do período da escravidão e pela persistência do racismo estrutural”.
Segundo a professora, essas desigualdades refletem de maneira clara no sistema educacional, onde estudantes negros e indígenas enfrentam obstáculos adicionais em seu percurso educacional, desde o acesso à educação até a conclusão de seus estudos. “Tudo isso é um obstáculo, se torna um obstáculo”, afirma.
Por fim, a professora Janine Rodrigues foi convidada a falar, ela que é diretora do projeto Piraporiando, uma organização que tem como principal trabalho a educação antirracista. Eles trabalham desde a formação de professores, na produção e curadorias de material didático e paradidático, além de fazer parcerias com o poder público, como o Ministério da Igualdade Racial, a Secretaria de Educação e o próprio Ministério da Educação.
Segundo a especialista, para termos instituições antirracistas, precisamos que as pessoas sejam, primeiramente, antirracistas. Tornar este processo mais próximo do indivíduo, tornaria as iniciativas mais simples e menos burocráticas, ela afirma. A professora ainda trouxe uma série de questionamentos sobre como as escolas devem se posicionar frente à intolerância, inclusive a religiosa, dentro das escolas.
Na relação entre fornecedores e clientes, as escolas não devem se anular para agradar o que alguns pais dos alunos querem. “Quando essa relação cliente e fornecedor atravessam os portões da escola, a gente tem um grande perigo, porque a responsabilidade da escola não é atender o desejo individual de cada família, a responsabilidade da escola é educar.”
Sobre a ANEC
A Associação Nacional de Educação Católica do Brasil (ANEC) é uma entidade sem fins lucrativos, de caráter educacional e cultural, representante da Educação Católica no Brasil, e reunida em comunhão de valores com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB).
A instituição atua em favor de uma educação de excelência para promover uma educação cristã evangélico-libertadora, entendida como aquela que visa à formação integral da pessoa humana, sujeito e agente de construção de uma sociedade justa, fraterna, solidária e pacífica, segundo o Evangelho e o ensinamento social da Igreja.
A associação também tem como objetivo proclamar a liberdade de ensino consagrada na Declaração Universal dos Direitos Humanos, na Constituição da República Federativa do Brasil e nos ensinamentos do magistério eclesial; promover a pesquisa científica, a extensão social e o desenvolvimento cultural a serviço da vida e representar a educação católica no país, em seus diversos níveis.
A ANEC atua em 900 municípios do Brasil, realiza 172 obras sociais e tem como associadas 1050 escolas, que incluem Creche, Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio, e 83 instituições de Ensino Superior, que atendem a mais de 1,5 milhão de alunos, além de 353 mantenedoras.