Em oitiva realizada pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Reconhecimento Fotográfico nas Delegacias, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), nesta quinta-feira (05/10), o presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Guilherme Carnelós, sugeriu a regulamentação do álbum de fotografia utilizado para identificar suspeitos nas delegacias, a fim de evitar a condenação de inocentes. O juiz de direito, André Luiz Nicolitt, que também participou da sabatina, salientou a importância da fiscalização e qualificação da atividade policial.
Segundo Carnelós, a utilização do reconhecimento fotográfico como prova única é um dos principais fatores que levam à prisão injusta. Isso porque as fotografias utilizadas, muita das vezes, não têm precedentes ou justificativa plausível. Para exemplificar sua tese, o advogado relembrou o caso do porteiro Paulo Alberto Costa, que passou três anos preso após ter sido acusado em mais de 60 processos baseados no reconhecimento de uma foto retirada de suas redes sociais e incluídas no álbum e no mural de suspeitos da Delegacia de Belford Roxo, na Baixada Fluminense.
“O principal ponto de atuação da CPI sobre esse tema é tentar regulamentar a atividade policial, especialmente quando a gente fala sobre o álbum de suspeitos. Precisamos saber como são formados esses álbuns, o porquê de eles existirem e como as fotografias vão parar lá,” ressaltou o advogado.
Ainda de acordo com Carnelós, a falta de estrutura e tecnologia policial deixa a investigação criminal atrelada às provas dependentes da memória, o que gera inúmeras identificações equivocadas e ainda colabora para a propagação do racismo estrutural.
“A memória humana não é um filme e existe a psicologia do testemunho que explica que o ser humano tem dificuldade de reconhecer traços identificatórios de outras raças. Então, uma pessoa branca, por exemplo, tem dificuldade de reconhecer traços de pessoas negras, indígenas, asiáticas e vice-versa. Isso é muito relevante para se levar em consideração na discussão do reconhecimento fotográfico porque se uma pessoa branca é vítima de um crime executado por uma pessoa negra, na delegacia ela vai reconhecer qualquer pessoa negra que minimamente se aproxima daquele biotipo. Isso tem um impacto muito severo, porque a população mais submetida ao sistema de justiça criminal é a população negra”, pontuou.
O juiz de Direito, André Nicolitt, reiterou a fala de Carnelós e deu sugestões de como o Poder Legislativo pode atuar na causa. “A Alerj tem dois papéis fundamentais nessa temática. O primeiro é criar políticas através da legislação, tanto para coibir como para reparar essas práticas. Além disso, os parlamentares podem fiscalizar as delegacias e os batalhões, além de solicitar informações para o judiciário sobre estatísticas, números de presos e erros fotográficos”, comentou.
Reparação judiciária
Na reunião, a CPI ainda debateu a questão da reparação judiciária para as vítimas de prisões injustas. Nicolitt reforçou, neste caso, a importância da cobrança social pelas reparações. “As instituições e os movimentos sociais devem pressionar o estado a criar medidas de reparações para as vítimas, para que se perceba que esse tipo de erro custa caro”, comentou.
A presidente da Comissão da Alerj, deputada Renata Souza (Psol), ressaltou a importância do debate para o desenrolar das próximas ações do colegiado. “Na CPI de hoje pudemos analisar a culpa do Sistema de Justiça na perpetuação de uma fragilidade que é o reconhecimento fotográfico e como ele não deveria ser uma prova irrefutável, por condenar erradamente inúmeros inocentes e ainda corroborar com o racismo estrutural. Segundo dados já apurados pela comissão, cerca de 80% dos erros judiciários afetam jovens negros. Além disso, percebemos que um processo de reparação para as vítimas deveria ser pensado e é mais uma questão que buscaremos através desse nosso trabalho”, disse a parlamentar.
Também estiveram presentes na reunião os deputados Munir Neto (PSD) e Júlio Rocha (Agir), e a deputada Dani Balbi (PCdoB).
Fonte: ALERJ