Teofilo e Roberta Tostes convivem com tipos diferentes de deficiência e compartilham a herança de amor pela escrita deixada por seu pai
As barreiras para as pessoas com deficiência ainda são um gigantesco obstáculo a serem superadas. Porém essa condição que poderia limitar a muitos, não foi capaz de frear os sonhos de dois irmãos apaixonados pela poesia. Ele com deficiência física (luxação coxofemoral e encurtamento da perna direita) e ela com TEA (Transtorno do Espectro Autista), diagnosticado de forma tardia. Teofilo e Roberta Tostes compartilham o amor pela escrita e trilham carreiras paralelas no universo da literatura.
Números da pesquisa “Relatos da literatura no Brasil”, feita pelo Instituto Pró-livro, revelam que 52% da população brasileira tem hábitos de leitura, onde a bíblia e livros religiosos são os preferidos. O estudo ainda aponta que, de 2016 a 2020 (ano da publicação da pesquisa), o país perdeu 4,6 milhões de leitores. Isso mostra os desafios que a leitura sofre, principalmente aquela mais nichada e menos comercial, como é o caso da poesia.
Roberta está para lançar seu terceiro livro no mês de março de 2024. “corpo-esconderijo” (Libertinagem) vai falar sobre a poética corporal. Em seus livros anteriores, uma poética subjetiva servia para esconder seus traumas, desconfortos e violências vividas. A escritora faz dessa voz que nomeia também uma voz que se afirma, transformando a palavra numa espécie de lar em que ela habita e se metamorfoseia.
“Receber o diagnóstico do TEA, mesmo tardio, foi como reingressar na estrada da minha vida, agora devidamente ciente dos níveis de velocidade, das curvas acentuadas, conhecendo enfim o movimento que coincide com os próprios horizontes reabertos”, revela Roberta sobre seu diagnóstico de autismo.
Enquanto isso, Teofilo já lançou três livros, dois deles pela Editora Patuá, uma das mais importantes do cenário de editoras independentes, além de contos, poemas e artigos em coletâneas, revistas literárias e culturais. Seu último livro lançado, “O Poeta Toma a Pólis” (Patuá), conta com 29 poemas da obra, onde o autor traduz em palavras as injustiças, indiferença e crueldade vistas em nosso país nos últimos anos.
“Quando digo que sou um homem com deficiência que escreve poesia talvez isso crie no imaginário das pessoas que sou alguém que escreve sobre meus desafios e minha luta por ‘superar’ essa condição. Então meu desafio é desconstruir essa expectativa. A deficiência não é algo a ser superado, vencido. É uma condição com a qual se convive. E a poesia é um território de elaboração e também de mudança do mundo”, reflete Teofilo.
Atraídos para a poesia por meio do exemplo dado por seu já falecido pai, os irmãos acreditam no valor da literatura e, mais ainda, no poder transformador que ela pode ter na vida das pessoas. “A poesia chegou como memorabilia familiar e possibilidade de criação de um lugar para mim no mundo. Ao inventar e decifrar signos, faço da escrita uma ponte, um projeto de vida em aprendizado contínuo e expansão da existência e seus pontos comunicantes”, revela Roberta. Já para Teofilo, que começou a escrever ao tomar contato com alguns poemas do pai na adolescência, “escrever foi dar uma resposta ao maravilhamento e às provocações que tudo o que eu lia na época me trazia”.
Fonte Marcelo Boero